terça-feira, 26 de janeiro de 2016

Amor é migalha de pão amanhecido.

certo mesmos eram os realistas que escreviam sobre as coisas do jeito que elas são e não do jeito que a gente quer que seja. as estrelas morrem. as flores morrem, todo mundo morre, inclusive os poetas. principalmente os poetas. astrologia é besteira, matemática não te ajuda em nada na vida e gelatina do hospital é ruim. meninos choram e meninas pensam em sexo. a vida real é intestino preso, é não ter mãe pra ir na apresentação da escolinha no dia das mães, é nariz sangrando manchando sua blusa branca, é ficar quieto por medo de falar a coisa errada. é prender o dedo na porta do carro, é acordar pensando na hora de ir dormir de novo, é ter pai mas não ter, é pagar contas contando moeda, é chorar porque a água do chuveiro está muito quente ou muito fria e você não consegue achar uma temperatura certa. é privilégio branco, é passar delineador mesmo com um olho roxo, é queimar brigadeiro, é esperar a sexta-feira pro fim de semana, é esperar ter 18 anos pra fazer o que quiser, é esperar o ano inteiro pro verão, é esperar a vida inteira pra se sentir bem. puta que pariu. minha vida não está nem perto do que era para estar. eu queria cortar o cabelo mas não tenho coragem e ás vezes acho que preciso emagrecer. o donald trump tem chance de se tornar o presidente dos estados unidos, as borboletas monarcas estão desaparecendo, meus pais vão morrer um dia, eu vou morrer um dia e o zayn saiu do one direction. malditos românticos que me ensinaram a morrer por amor. ninguém nunca me disse a verdade e eu tive que esfregar a cara no asfalto pra aprender por conta própria.
amor não alimenta.
amor não dá teto, comida e roupa lavada. não dá vaga na faculdade, não cura dengue, não compra presente de aniversário, não paga aparelho ortodôntico nem passagem de ônibus para belo horizonte. é uma enganação que te faz de trouxa e você ainda agradece no final.
amor é aquilo que te impede de abortar um filho que você não quer e que será condenado a uma vida de rejeição. é o que te faz insistir em um relacionamento com um canalha que transou com uma morena na balada ontem enquanto você esperava ele te responder no whatsapp. é pagar academia durante cinco meses e ir três vezes e achar que isso vai resolver sua vida. é trocar conversa fiada com o ex-namorado sem nem saber porque. é auto sabotagem.
amor é querer chorar e não conseguir. é sentir um oceano de lágrimas não choradas te afogando por dentro. é ficar assim por dias e dias até finalmente você ir no mcdonalds as três da manhã e começar a chorar porque você não sabe se escolhe uma tortinha de maçã ou de banana. aí você começa a chorar descontroladamente tudo que não tinha chorado antes e pede desculpa pra atendente porque ela foi tão simpática e ela não tem nada a ver com isso, mas aí você lembra daquele menino que morreu num acidente de carro mês passado e pensa que poderia facilmente ter sido você ou um dos seus amigos, lembra que os resultados da unesp não saíram ainda e tem uma grande chance de você não ter passado, lembra que os índices de suicídios entre transexuais são tão altos no brasil e toda essa tristeza acaba virando uma coisa só e você nem sabe mais porque está chorando.
amor é eu te falar tudo que eu sinto por você, me despir na sua frente e te dizer, nua, com uma honestidade visceral que me faz querer vomitar de nervoso. mas amor também é essa palhaçada que existe entre a gente, sem nome, sem nada, mas que eu continuo insistindo por alguma razão porque você conseguiu me ter por inteiro e agora eu não consigo mais. não consigo mais seguir em frente. amor é o que te impede de seguir em frente. amor é o que me impede de seguir em frente.
quando a gente olha o céu e vê uma estrela que nem existe mais.  amor é isso. é olhar encantada pra alguma coisa quando ela nem existe mais. é ilusão. amor é uma miragem. amor é racismo reverso. não existe. amor é um truque de mágica barato onde um charlatão tira um coelho de uma cartola e você bate palma. você conhece esse truque desde que tinha 8 anos de idade e sabe que o coelho estava numa caixa debaixo da cartola e sente dó da magreza a da falta de pelos do maldito coelho e quarenta e cinco reais foi caro demais pra essa baboseira toda e sua cadeira é dura demais, o ar condicionado está desligado, mas você bate palma mesmo assim. você bate palma porque se sujeita a fingir que acredita que o coelho saiu da cartola como mágica. porque amor é ver as coisas como a gente quer que elas sejam e não como elas são.
e amor não paga minhas contas.

quinta-feira, 21 de maio de 2015

fluxo de consciência


está tudo bem.
eu não tenho mais medo de andar em ambulâncias nem de voltar sozinha para casa ás três da manhã com uma saia curta. não coloco as mãos na frente do meu rosto quando sinto que vou cair no chão porque não tenho mais medo de cair. é difícil se assustar com um incêndio, quando tudo dentro de você está pegando fogo. tudo ao meu redor está pegando fogo. vestibular, dívidas, blusas furadas, amigos que não se gostam, fones de ouvido que não funcionam, mãos tremendo, dentes quebrados, depressão, prostituição, comida desperdiçada, 50 mil mulheres estupradas por ano, 50 mil acidentes de trânsito por ano, animais abandonados, bolos de aniversários que dão errado, professores de literatura que vão embora. a vida oprime e a culpa é do homem branco.
já parou para pensar em quantas pessoas já andaram pela terra? em quantas pessoas estão mortas debaixo da terra? quantas flores, inclusive as que você deu para sua mãe no dia das mães, nasceram de cadáveres? quantas sardas, quantas cicatrizes, quantos cílios, quantos hematomas arroxeados, quantos olhos castanhos já existiram? que prato cheio para roteiristas pensar na primeira vez que alguém comeu chocolate ou na última imagem que uma pessoa viu antes de morrer. já parou para pensar que cada uma dessas pessoas era exatamente como eu e você, tivesse sido van gogh e sua preferência pela cor amarela ou alguma outra pessoa cujo nome não foi impresso em livros de história da arte? a verdade é que van gogh não vendeu um único quadro quando estava vivo e na maior parte das vezes os anônimos da historia do mundo foram mulheres. que triste é pensar nisso.
por alguma razão, durante sonhos, devaneios acordada ou banhos longos demais, a imagem de uma menina á beira de um lago, que poderia ter existido durante a idade média me acomete. eu não sei quem ela é - quem sabe os espíritas não estão certos e ela fez parte de alguma das minhas vidas passadas? mas é como se ela fosse uma alegoria criada na minha cabeça para todas as pessoas que existiram e que poderiam ter sido amadas por mim, não estivéssemos separadas por séculos ou quilômetros. queria poder segurar as mãos de van gogh e dizer que tudo vai ficar bem e que ele é amado por mim e por milhões de pessoas. sinto uma estranha necessidade de ajudar as pessoas, inclusive as que nunca terei chance de ajudar. deus eu não consigo nem me ajudar, mas sonho durante o dia sobre garotas mortas? sobre garotas que talvez nem nunca existiram? eu li uma vez que o cérebro humano não tem a capacidade de inventar rostos. talvez ela seja uma mórbida projeção minha, talvez ela tenha sido eu mesma há muito tempo, talvez eu esteja perdendo toda a pouca razão que ainda existe em mim.
me sinto como uma pia cheia de louça suja que ninguém lava há três dias. como uma postura errada e uma mochila que te deixa com dor nos ombros no fim do dia. como uma casa em chamas.
ás vezes tenho vontade de me jogar no mar. de colocar dark side of the moon no último volume ás duas da manhã. de usar roupa preta, saia curta, batom vermelho, ficar bêbada, me jogar na frente de um carro. vontade de comer um pote de sorvete sozinha, de gritar tudo que eu penso, de socar alguém, ficar com a menina mais bonita da minha sala. levar um soco, cuspir sangue e beijar sua boca de uma vez por todas. vontade de desarrumar meu quarto, de jogar essas listas de "coisas para fazer" no lixo, de rasgar esse laços, de jogar esses cremes com cheiro de baunilha no lixo.
me sinto um caos.
e não tem nada que eu possa fazer a não ser me acostumar com o fogo, sentar á mesa do diabo e tomar um café frio sem açúcar, sem reclamar. ás vezes acabo queimando as pontas dos dedos e tenho que procurar uma caixa de band-aids pela casa durante vinte minutos só para encontrá-la vazia. continuo sangrando. é até melhor assim. deixa a ferida respirar. mas o sangramento ainda não parou e eu conto minhas bênçãos e agradeço a deus por tudo que ele me deu. se eu admitisse estar vivendo no inferno, provavelmente me jogaria nas chamas. eu não sei mais fazer nada. durmo demais ou de menos, esqueço aniversários, ouço a mesma música durante horas e procuro coisas debaixo da cama mesmo sem saber ao certo o que perdi. eu regurgito perdões, acordo engasgada com flores depois de sonhar com jardins de arrependimentos e escrevo textos com enumerações demais. eu não sei mais viver. eu só gosto do mundo ás quatro da manhã. sinto vontade de chorar em museus e estou cansada de pedir desculpas. sou uma suicida com vocação para vida. eu digo que quero morrer, mas só quero ficar bem.
epifania significa tomar consciência da sua condição. meu professor de literatura me ensinou isso. 

terça-feira, 1 de julho de 2014

época de pêssegos.


Vontade de me juntar às estrelas.
Deixar essas receitas de bolo que nunca dão certo e calças que nunca servem para trás. Esquecer frutas estragadas e vontades súbitas de rasgar os pulsos. Flores mortas (por minha culpa) e dor de estômago. Ansiedade, semáforos, vontade de vomitar, joelhos ralados e sapatilhas que machucam o pé.
Mas isso significa deixar sorvete de menta e passagens de ônibus para trás também. Abandonar papéis de carta cor de rosa, citações do pequeno príncipe e o som de trompetes.
Chás com bolhas, festas surpresas, conselhos de horóscopos, filmes com a Marilyn Monroe, lanches de geleia de amora com pasta de amendoim e músicas que eu nem ouvi ainda (noites que se tornam manhãs e amigos que se tornam família). Significa deixar meia dúzia de sardas em outras cidades para sempre.

Saudades das estrelas.


sábado, 20 de abril de 2013

Eu escrevo porque não sou ouvida.


Eu sou uma alma inextricável; citações de filósofos que não conheço, pedaços de poemas que ainda não tive tempo de decorar e promessas que não cumpri feitas inconsequentemente às duas da manhã; todos emaranhados como se fossem um único capítulo, sem distinção de onde eu começo e onde termino.
Eu vivo constantemente me arrastando porque as coisas que carrego dentro de mim são pesadas demais.
São pesadas como as chuvas que caem durante a madrugada, como um cilindro de oxigênio, como pálpebras que caem de sono em meio a lamentações, pesadas como pétalas de rosas apodrecidas que ao invés de caírem são extirpadas. Pesam e ardem; ardem como uma ferida aberta cutucada por dedos curiosos, que tenta constantemente se fechar, mas sempre é interrompida. A ferida é interrompida.
Eu sou a ferida.
E queria eu, ser inteira novamente.

terça-feira, 18 de setembro de 2012

purple are my feelings for you.


Faz tempo que eu não escrevo.
Costumava ver poesia em tudo – a sensação artificial de frio numa sala com ar condicionado e uma voz falhada virava verso em cinco minutos – e ter a capacidade de embelezar os sentimentos mais banais através de algumas palavras açucaradas.
Mas eu ando cansada (o hábito de tomar café não costumava ser tão comum até três meses atrás) e sem inspiração.
Porque eu me distanciei do que me inspirava. A cama arrumada tornou-se a primeira prioridade do meu dia, meus cadernos coloridos foram deixados de lado, as canetas secaram e a mesa passou tempo demais limpa e arrumada.
É triste, pensar que alguém que tanto preza a arte de escrever, se distanciou de tudo aquilo que lhe dava vontade de colocar palavras num papel.
A verdade é que nenhum professor de literatura fala o que realmente é expressar tudo que você sente, metaforizar tudo que você representa, exagerar tudo aquilo que você é e vomitar tudo que você pensa em meia dúzia de linhas. Nenhum professor de redação diz como é doloroso esse processo e como te deixa vulnerável. Como te transforma em uma pessoa constantemente inacabada; fragmentos de pessoas, citações aleatórias de autores já falecidos e ideologias perdidas. O que era uma alma de poeta passa a ser nada mais, que uma alma mutilada.
Por esses motivos, de tempos em tempos, eu me olhava no espelho um pouco antes de tirar a maquiagem e me via em pedaços. Quebrada. Eu sabia que não era uma pessoa completa; eu não era eu ainda.
Então, era natural que eu sentisse a necessidade de consertar todas as coisas que estavam quebradas dentro de mim – ossos e promessas. A diferença era que eu sabia que não eram rimas que iriam me remendar dessa vez.
Então eu continuei me mantendo longe de tudo que me desse vontade de pegar um papel e um lápis. Tornei-me apática – alienada –; no entanto, achei que estivesse bem. Pensei que estava fazendo as coisas da maneira correta e que tudo estava melhorando – pelo menos deveriam, afinal eu me afastei das más companhias, pintei as unhas de cor de menta e me enchi de músicas alegres.
Foi aí então, que de repente, como se eu estivesse tendo algum tipo de reação alérgica ao universo e á mim mesma; um sorriso – que da última vez que eu o vi, podia jurar que ainda não tinha duas adoráveis covinhas – provou que eu estava errada.
Aliás, eu estava me enganando todo esse tempo. Tentativa admirável, claro – o prêmio de fracassada do ano vai para mim– mas de verdade, nenhuma das mensagens positivas que eu enfiei na cabeça nem nenhuma cama arrumada fizeram alguma diferença.
Porque a partir do segundo que eu ouvi a sua voz dizer o meu nome depois de tanto tempo, eu juro que meu primeiro pensamento fora descrever a cor encantadora dos seus olhos num soneto decassílabo. Porque por mais que eu tente evitar, você sempre fora minha única, grande e maior inspiração.
Como conclusão, eu não tive capacidade de consertar nada dentro de mim mesma. Continuo um borrão de emoções arroxeado e devo admitir que depois de tanta resistência á minha verdadeira essência, minha estrutura emocional fora abalada e minha criatividade já não é mais a mesma.
E por mais dolorido que seja, eu sinto falta da mesa bagunçada, das canetas sem tampa; as folhas amassadas, as palavras riscadas e a mão suja de tinta.
Eu sinto sua falta.