certo mesmos eram os
realistas que escreviam sobre as coisas do jeito que elas são e não do jeito
que a gente quer que seja. as estrelas morrem. as flores morrem, todo mundo
morre, inclusive os poetas. principalmente os poetas. astrologia é besteira, matemática não te ajuda em
nada na vida e gelatina do hospital é ruim. meninos choram e meninas pensam em
sexo. a vida real é intestino preso, é não ter mãe pra ir na apresentação da
escolinha no dia das mães, é nariz sangrando manchando sua blusa branca, é
ficar quieto por medo de falar a coisa errada. é prender o dedo na porta
do carro, é acordar pensando na hora de ir dormir de novo, é ter pai mas não
ter, é pagar contas contando moeda, é chorar porque a água do chuveiro está
muito quente ou muito fria e você não consegue achar uma temperatura certa. é
privilégio branco, é passar delineador mesmo com um olho roxo, é queimar
brigadeiro, é esperar a sexta-feira pro fim de semana, é esperar ter 18 anos
pra fazer o que quiser, é esperar o ano inteiro pro verão, é esperar a vida
inteira pra se sentir bem. puta que pariu. minha vida não está nem perto do que
era para estar. eu queria cortar o cabelo mas não tenho coragem e ás vezes acho
que preciso emagrecer. o donald trump tem chance de se tornar o presidente dos estados unidos, as borboletas monarcas estão desaparecendo, meus pais vão
morrer um dia, eu vou morrer um dia e o zayn saiu do one direction. malditos românticos que me
ensinaram a morrer por amor. ninguém nunca me disse a verdade e eu tive que
esfregar a cara no asfalto pra aprender por conta própria.
amor não alimenta.
amor não dá teto,
comida e roupa lavada. não dá vaga na faculdade, não cura dengue, não compra
presente de aniversário, não paga aparelho ortodôntico nem passagem de ônibus
para belo horizonte. é uma enganação que te faz de trouxa e você ainda agradece
no final.
amor é aquilo que te
impede de abortar um filho que você não quer e que será condenado a uma vida de
rejeição. é o que te faz insistir em um relacionamento com um canalha que
transou com uma morena na balada ontem enquanto você esperava ele te responder no
whatsapp. é pagar academia durante cinco meses e ir três vezes e achar que isso
vai resolver sua vida. é trocar conversa fiada com o ex-namorado sem nem saber
porque. é auto sabotagem.
amor é querer chorar
e não conseguir. é sentir um oceano de lágrimas não choradas te afogando por
dentro. é ficar assim por dias e dias até finalmente você ir no mcdonalds as
três da manhã e começar a chorar porque você não sabe se escolhe uma tortinha
de maçã ou de banana. aí você começa a chorar descontroladamente tudo que não
tinha chorado antes e pede desculpa pra atendente porque ela foi tão simpática e ela não tem nada a ver com isso, mas aí você lembra daquele menino
que morreu num acidente de carro mês passado e pensa que poderia facilmente ter
sido você ou um dos seus amigos, lembra que os resultados da unesp não saíram
ainda e tem uma grande chance de você não ter passado, lembra que os índices de
suicídios entre transexuais são tão altos no brasil e toda essa tristeza acaba
virando uma coisa só e você nem sabe mais porque está chorando.
amor é eu te falar
tudo que eu sinto por você, me despir na sua frente e te dizer, nua, com uma
honestidade visceral que me faz querer vomitar de nervoso. mas amor também é essa palhaçada que existe entre a gente, sem
nome, sem nada, mas que eu continuo insistindo por alguma razão porque você
conseguiu me ter por inteiro e agora eu não consigo mais. não consigo mais
seguir em frente. amor é o que te impede de seguir em frente. amor é o que me
impede de seguir em frente.
quando a gente olha
o céu e vê uma estrela que nem existe mais.
amor é isso. é olhar encantada pra alguma coisa quando ela nem existe
mais. é ilusão. amor é uma miragem. amor é racismo reverso. não existe. amor é
um truque de mágica barato onde um charlatão tira um coelho de uma cartola e
você bate palma. você conhece esse truque desde que tinha 8 anos de idade e
sabe que o coelho estava numa caixa debaixo da cartola e sente dó da magreza a
da falta de pelos do maldito coelho e quarenta e cinco reais foi caro demais pra
essa baboseira toda e sua cadeira é dura demais, o ar condicionado está
desligado, mas você bate palma mesmo assim. você bate palma porque se sujeita a
fingir que acredita que o coelho saiu da cartola como mágica. porque amor é ver
as coisas como a gente quer que elas sejam e não como elas são.
e amor não paga
minhas contas.